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Opinião

O Antirracismo de Vitrine

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Por Rodrigo Vargas – Jornalista

No Dia da Consciência Negra (comemorado no dia 20 de novembro), o Brasil acorda com uma convicção bonita: somos todos antirracistas. Pelo menos até a meia-noite. É impressionante, e quase poético, como brotam discursos inflamados, fotos em preto e branco, hashtags indignadas, frases de efeito cuidadosamente escolhidas. Tudo muito certo, muito alinhado, muito confortável.
Mas basta deixar passar algumas horas para que o verniz comece a rachar.
Descobre-se, então, que boa parte dessas bandeiras erguidas contra o racismo não foi levantada para proteger ninguém. Foi levantada para proteger “alguém” a própria imagem.
Se existe um fenômeno tipicamente brasileiro é esse: a militância performática, o antirracismo de vitrine. Tão impecável quanto uma loja de shopping. Tão vazio quanto o estoque nos fundos.
É fácil reconhecer seus praticantes. São aqueles que fazem discursos emocionados, desde que ninguém pergunte quantas pessoas negras ocupam cargos de liderança em seus espaços de trabalho. São os que repetem citações de Angela Davis, mas não conseguem conversar com o porteiro sem mudar o tom de voz. São os que publicam frases sobre igualdade, mas seguem atravessando a rua quando veem um jovem negro vindo na direção contrária.
O racismo, para eles, é um tema — nunca uma responsabilidade.
É doloroso perceber que, para muitos, combater o racismo virou uma espécie de selo social, um “ativo reputacional”, um certificado de boa conduta. E, como todo ativo valioso, só é exibido quando há plateia. É indignação que dá engajamento. Empatia que cabe no feed. Consciência que dura menos que a bateria do celular.
Enquanto isso, quem realmente vive o racismo continua onde sempre esteve:
na porta que não abre; na vaga que não chega; na abordagem policial que não explica nada; na desconfiança automática; no sorriso que desaparece quando se revela o endereço; no currículo que some na pilha errada.
Os que levantam bandeiras apenas para se promover não percebem, ou não querem perceber, que o racismo não é uma metáfora, não é um tema de redação, não é instrumento de narrativa. Ele é uma engrenagem real, pesada, diária. E, para quem está preso dentro dela, não existe descanso, feriado, nem hashtag que alivie.
Talvez o maior problema não seja quem discursa o óbvio, mas quem discursa o óbvio apenas quando lhe convém, esquecendo que o combate ao racismo exige coragem, não conveniência. Exige perder privilégios, não ganhar likes. Exige atitude quando ninguém está olhando, e principalmente quando alguém está.
O Dia da Consciência Negra não é uma celebração. É um chamado.
E, se não resultar em consequência, continuará sendo o que tantos transformaram: um belo exercício de autopromoção.
Porque consciência sem ação é só marketing.
E marketing não muda o mundo.
A luta muda.

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