21°C
Erechim,RS
Previsão completa
0°C
Erechim,RS
Previsão completa

Publicidade

Expressão Plural

Primavera: afinação

teste
Gerson Egas Severo
Por Gerson Egas Severo
Foto Arquivo pessoal

 “Foi o sorriso do alvorecer da primavera/ Que fez meu peito fulgurar?/ Era doce, mas nem o sol e nem o vento/ Conseguiram animar tanto meu espírito./ Seria este um sentimento aprazível/ Tão vago e indefinido?/ Não, era um arrebatamento profundo e forte/ Expandindo na minha mente!”

            Esse é o poema – chamado “In Memory of a Happy Day in February” – com que Anne Brontë, irmã de Emily, a autora de “O Morro dos Ventos Uivantes” (romance em que a descrição do mundo natural é de crucial importância para a narrativa), recebeu alguma das poucas primaveras que viveu. Ela morreu em 1849, com apenas vinte e nove anos.

            Faço uso de sua poesia para, como costumo fazer nos dias de solstício e equinócio, trazer à atenção do leitor/a uma reflexão do escritor e filósofo sino-americano Deng Ming-Dao, baseada na noção chinesa de Tao, ou Caminho, e na cultura do I Ching, o Livro das Mutações, filosofias que compõem os fios, embora não exclusivos, da trama de seus inspirados ensaios. Neste, chamado “Afinação”, o autor alerta para a passagem dos ciclos das estações como oportunidades excelentes para ajustarmos o som de nosso ukelele interior com a música do mundo. Vida interior e mundo, o mesmo diapasão. A música das esferas.

“Afinação

O Sol, em sua travessia, conduz a uma nova estação; o alento primaveril afina as folhas.

Tao, o Caminho, está aqui. Nós é que não estamos em harmonia com ele.

O Caminho procede à sua própria maneira. Nós é que não estamos prontos para acompanhá-lo.

O Caminho é absolutamente seguro em seu movimento. Nós é que nos envolvemos em distrações.

O Caminho não tem consciência; é, porém, supremo. Nós é que pensamos compulsivamente.

Portanto, afinarmo-nos com o Tao, com o Caminho, é a tarefa básica. Devemos nos tornar o instrumento perfeito, da mesma maneira que uma bela harpa tem todas as suas cordas reguladas. Se somos menos do que perfeitos, como nos harmonizarmos com a música universal? Uma vez afinados, nos tornamos abertos ao Caminho. Aonde ele conduz, seguimos sem hesitação. Assim como um músico expressa talento e compreensão individuais e, não obstante, funde-se à magnificência crescente da orquestra, o seguidor do Caminho permanece humano, mas em harmonia com o universal.

            Quando o Sol começa seu novo padrão, segue-se a primavera. O ar se aquece e o mundo se rejubila. Um novo alento sobrevém a todas as coisas, e mesmo as folhas trêmulas afinam-se o ritmo primaveril. Volte seu rosto para o Sol, como as flores sabem fazer. Volte seu rosto para o Caminho, como devemos todos fazer.”

            Algo de Brontë e de Ming-Dao, guardando as ideias de “arrebatamento profundo e forte” e de “alento”, está expresso também em “Girassóis”, a canção de Duca Leindecker: “Deixo o sol bater na cara/ E esqueço tudo o que me faz mal/ Deixo o sol bater no rosto/ Que aí o desgosto se vai.” Quase um banimento: vai!

Publicidade

Publicidade

Blog dos Colunistas

;