O 2º Concurso Trancista Afro RS, realizado no dia 9 de novembro na Fenac – Feira Sul Beleza, em Novo Hamburgo, reuniu profissionais do estado em um encontro de talento, arte e afirmação da identidade negra. Entre as finalistas, Francieli dos Santos Silveira, de Erechim, foi premiada com o primeiro lugar por um trabalho que mistura tradição, criatividade e resgate cultural.
Emoção e trajetória
“Na hora que a Elisa gritou meu nome, eu só pensei nos meus filhos e em tudo que a gente já passou. Foi tão emocionante”, contou Franciele, lembrando que estar entre as 10 finalistas já era motivo de alegria. Desde a primeira edição do concurso, participar sempre foi um sonho: “Fazer parte de um time de profissionais tão incríveis foi uma realização. Esse concurso foi o acontecimento mais marcante da minha história”.
Levando Erechim ao evento estadual
A trancista destacou a importância de levar o nome da cidade para um evento desse porte: “Minha cidade fez eu me tornar a profissional que sou. Trazer essa visibilidade é um privilégio. Desde quando atendia em um sofá velho na minha casa, minhas clientes sempre estiveram comigo, me apoiando”, lembrou. Para ela, essa experiência também é um gesto de valorização e orgulho da negritude: “Nós, mulheres negras, nem sempre temos acesso a essas oportunidades, então buscar espaço e reconhecimento é algo que me enche de alegria”.
O penteado vencedor
O concurso contou com duas etapas. Na primeira, todas as participantes precisaram criar tranças boxeadoras, conhecidas por seu desafio até para profissionais experientes. Na segunda, modelo livre, Francieli optou pela trança nagô, formando uma espécie de coroa ao redor da cabeça, complementada por um coque alto. “Quis criar uma coroa de tranças para reforçar o poder do nosso cabelo crespo. A trança nagô é minha paixão, carregada de história e resistência”, explicou.
A inspiração de Francieli vem de mulheres negras que admirava e de referências do universo trancista, incluindo os organizadores do concurso. “Trabalhar com o resgate da autoestima dessas mulheres é o maior incentivo do meu trabalho. Mulheres como Idalice Moreira Bastos e a Elisa Mateus são referências valiosas para mim”.
Preparação e dedicação
A preparação envolveu dias intensos de treino, dedicação integral e foco total: “Uma semana antes do concurso, peguei três modelos e treinei em cabeça de treino também. Fechei minha agenda, deixei de atender clientes para me dedicar completamente. Queria fazer valer cada segundo, e consegui!”
Significado do prêmio
Para Franciele, o prêmio representa visibilidade, valorização profissional e a possibilidade de abrir caminhos para outras mulheres: “Ser exemplo para muitas de mim é um privilégio. Conquistar esse reconhecimento no Rio Grande do Sul é um símbolo de resistência e orgulho para todas as trancistas do nosso país”, disse.
A conquista também abre portas para apoiar outras mulheres. “Vou abrir quatro vagas gratuitas para mulheres e ajudá-las a entrar nesse mercado. Parte do prêmio será destinada ao tratamento do meu filho de cinco anos, que tem uma doença crônica. Como mãe solo, não posso parar de trabalhar, então esse apoio é muito importante”.
Tranças como expressão cultural
Francieli reforça a dimensão histórica e cultural das tranças: “Fazer o resgate de toda essa história é um símbolo de resistência. O cuidado com a cabeça sempre foi algo muito respeitado, nosso Orí é a conexão mais próxima que temos com o nosso sagrado”.
O concurso distribuiu R$ 15 mil ao primeiro lugar, R$ 10 mil ao segundo e R$ 7 mil ao terceiro, além de outros prêmios relacionados à área. A competição reforça a cultura afro-brasileira, o empreendedorismo feminino negro e a arte das tranças como expressão de identidade, ancestralidade e valorização cultural.