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Mentes inquietas: saúde mental e aprendizagem infantil

Segundo a Associação Brasileira do Déficit de Atenção, o Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), é um dos temas mais estudados na atualidade em crianças em idade escolar

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No caso de Bernardo, a música foi sua aliada junto ao tratamento
Por Taiane do Carmo/ Scheila Zang
Foto Scheila Zang

Para muitos meninos pré-adolescentes, a maior paixão é o futebol. Para Bernardo Marques da Silva, 13 anos, é a música. Na sua rotina, dividido entre os afazeres de casa e atividades da escola, já é de praxe no mínimo uma vez durante a semana ele acordar, ligar o computador e fazer uma live para seus fãs no facebook. “As pessoas adoram vê-lo cantar”, conta orgulhosa, com uma cuia de chimarrão na mão, a mãe dele, Lurdes Marques de Mello.

No pequeno cômodo que antecede a sala de estar, a cortina vermelha que bloqueia a entrada do sol pela janela é a mesma que serve como plano de fundo para as apresentações de Bernardo, na Internet. Quando chega em casa da escola, ele logo se ajeita nos degraus de azulejos marrons da escada que leva ao andar superior, enquanto cumprimenta todos que estão na cozinha, lugar que acolhe cada um que chega da rua, onde se acomodam, como se estivessem na própria casa. “Entra e puxa uma cadeira, vamos tomar um mate”, diz Lurdes, quando o barulho no portão anuncia um novo visitante. Enquanto a cuia passeia de mão em mão, os visitantes ficam atentos ao menino que no início parece receoso, mas logo se anima e começa a falar sobre a música. “Deixei meus equipamentos na escola, por causa da apresentação que vou fazer, se não, eu cantava para vocês”, fala entusiasmado. 

O barulho vindo da televisão serve como trilha sonora e ele tira o casaco por conta do calor. “Agora sentem aí, que eu vou contar a minha história”, diz. A mãe e o padrasto sentados ao redor da mesa quadrada esperam enquanto os visitantes observam o menino pegar o controle e baixar o volume da TV. “Preciso de voz”, fala ao se sentar no topo da escada. “A minha história é o seguinte: desde pequeno comprava aquelas coisas de karaokê e brincava de cantar. Tocava em latinhas e aos cinco anos ganhei uma bateria. Depois comecei a fazer rima e brincava disso com meus primos. Depois, aos 11 anos fui em uma festa de um tio e pediram pra eu cantar. Daí comecei a cantar e me soltei, foi quando comprei meu primeiro microfone e fiz vídeos. Como bastante gente viu e gostou, comecei a fazer as minhas lives”, conta orgulhoso.

A música é seu refúgio, onde direciona todas as suas energias. Diagnosticado aos sete anos com hiperatividade, Bernardo percorreu uma longa jornada até encontrar algo que o ajudasse a equilibrar sua rotina agitada. No caos de sua mente, a música foi o caminho para encontrar sossego e a calmaria que tanto ansiava. 

O Transtorno

Segundo a Associação Brasileira do Déficit de Atenção, o Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), é um dos temas mais estudados na atualidade em crianças em idade escolar. É um transtorno neurobiológico de causas genéticas, que surge na infância e frequentemente acompanha o indivíduo por toda a sua vida. Tem características por sintomas de desatenção, inquietude e impulsividade. 

O transtorno já teve outras denominações como Síndrome da Criança Hiperativa, Lesão Cerebral Mínima, Disfunção Cerebral Mínima, Transtorno Hipercinético e Transtorno Primário da Atenção. De acordo com a psicopedagoga Aline Moraes Lara, o portador de TDAH tem alterações na região frontal e suas conexões com o resto do cérebro, região responsável pela inibição do comportamento, capacidade de prestar atenção, memória, organização e planejamento. As dificuldades encontradas, muitas vezes, estão relacionadas a aprendizagem escolar, mas não se restringem a isso. “O portador de TDAH encontra dificuldades de organização, controle emocional e tem um risco maior de desenvolver outros transtornos”, avalia a profissional. 

A psicopedagoga revela que as crianças são afetadas, principalmente, em sua autoestima em relação à aprendizagem, pois os sintomas interferem na maneira como aprendem. “Há também um prejuízo nas relações sociais. A criança com TDAH é plenamente capaz de aprender, desde que esteja recebendo o tratamento-acompanhamento adequado”, pontua Aline. 

No caso de Bernardo, Lurdes percebeu que havia alguma coisa a mais no comportamento dele, mas sempre foi deixando pra depois. “A gente já tinha percebido, eu até ia levar ele no médico, mas aí o tempo foi passando, ele fez o prézinho e foi tudo bem, e eu fui deixando”, explica. Foi só quando Bernardo começou a primeira série do fundamental que os problemas, de fato, começaram. “Na metade da primeira série, as professoras não aguentaram mais, porque ele conversava demais, terminava as tarefas dele e ficava agitando a classe. Saía do lugar dele e ia ajudar os coleguinhas, aí as professoras me chamaram para encaminhar ele para um médico”, conta. Nas primeiras consultas com o psiquiatra, Lurdes conta que Bernardo era muito inquieto, sempre nervoso e aflito. “Ele levantava e mexia em tudo que tinha dentro do consultório, sempre nervoso, ansioso. O médico disse pra olhar com os olhos, não com a mão, ele sentou, mas não demorou muito e começou a agitar as mãos, pernas, inquieto”, relata a mãe. Antes de começar qualquer tratamento, o médico mandou fazer um mapa cerebral e os resultados foram todos normais. “Era só ansiedade. Ele começou o tratamento para combater a ansiedade”, declara. 

O elo com a música

Lurdes conta que o médico sempre orientou que Bernardo realizasse alguma atividade. “O doutor disse que era muito bom ele cantar, que as energias iam tudo ali. Desde que começou, a ansiedade dele diminuiu bastante”, avalia.

Embora o vínculo que se estabelece entre ciência e música sejam frágeis, eles acabam se encontrando quando os pacientes com TDAH estabelecem um contato com a música. Isso se revela positivamente em relação à saúde mental, como no aprendizado, memória e psicomotricidade. Esses benefícios, segundo o estudo, são comprovados por meio de técnicas de neuroimagem, que possibilitam o estudo do cérebro de pessoas que estudam música. Mas ainda são necessários estudos mais profundos que comprovem que a música pode ajudar no funcionamento dos neurônios.

 

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