Uma relação que começou muito cedo de maneira intensa e que evolveu superação cada dia. Aprender um ofício sozinho, pela determinação de querer fazer, de vê-lo em prática e movido pela paixão à cutelaria. Essa é a história do tatuador e cuteleiro, Gabriel Turski, de 20 anos, natural de Erechim, que desde os 8 anos produz facas artesanais e ferramentas, de forma autodidata.
Histórias e projetos
“Aos 5 anos de idade fui morar em Santa Catarina com minha avó, inspirado em histórias, livros, fotos e filmes, comecei a fazer os primeiros projetos de espadas, facas e adagas. Sempre gostei de desenhar e encontrei aí uma forma de efetuar meus projetos”, lembra.
Aos 7 anos, Gabriel se mudou para Porto Alegre, e lá o seu tio mostrou o filme "O último samurai" sendo essa a primeira vez que viu de fato como eram feitas as espadas. “Fiquei fascinado pela possibilidade de poder eu mesmo fazer uma espada como aquela”, disse.
Experimentos e criatividade
A partir daí, passou meses estudando com afinco todo o processo de fabricação, desde a produção do aço até os acabamentos mais refinados. “Minha família tinha oficina de chapeação automotiva, então, para desespero de minha mãe, comecei a pegar emprestado algumas ferramentas da oficina, como soprador térmico, alicate, marreta, e com um pouco de lenha, que achava na rua e um pouco que conseguia em uma pizzaria, fazia fogo para forjar. Forjava qualquer material. Foi um ótimo período para experimentações e expansão da criatividade”, comenta.
Preciosos conhecimentos
Conforme Gabriel, como não tinha professor ou orientador sobre o assunto, ele buscava informações com qualquer profissional que pudesse trazer mais conhecimento. “Quando estamos abertos para aprender com humildade, as pessoas são generosas e atenciosas. E, assim, conheci o senhor Gilberto, que tinha uma oficina mecânica. Nos tornamos grandes amigos. Comecei a usar aço reciclado que ganhava dele. Ele me ensinou sobre tratamento térmico, a dureza de cada material e tantos outros preciosos ensinamentos”, afirma.
Fabricar ferramentas
A empresa da família passava por sérias dificuldades financeiras e, embora desejassem, era impossível investir em maquinários e mesmo ferramentas simples para ele trabalhar. “Então, eu encontrava um modo de fabricá-las ou improvisava trazendo materiais reciclados da rua (lixo). Também fazia pequenos trabalhos para conseguir algum dinheiro e adquirir o que podia”, observa.
“Nestas experiências, apertei demasiado uma pilha na morsa, que explodiu nos meus olhos. Felizmente, me recuperei sem sequelas. Segui tendo apoio, porém, com a promessa de usar os devidos equipamentos de proteção individual (EPI’s)”, conta.
A cutelaria
Com 10 anos, seu Olavo, amigo e incentivador, falou para Gabriel de uma feira de cutelaria, em Porto Alegre, no DC Navegantes. “Passei a frequentar a feira, ver trabalhos de outros cuteleiros e aprender com eles também. Conheci os irmãos D'avila, Cristiano e Márcio, que me acolheram fraternamente. Convidaram para conhecer sua oficina em Tapes. Viajava sozinho às 4h da manhã para ir até lá. Fui recebido na residência da família e tive oportunidade de absorver muitos conhecimentos na fábrica”, afirma.
Aos 13 anos participou como expositor da feira anual da Associação Gaúcha de Cutelaria (AGC). Nesse dia, conheceu grandes nomes da cutelaria nacional, como Tom Silva e Daniel Jobim, que posteriormente se tornariam meus professores e, também, ganhadores do reality show Desafio Sob Fogo América Latina.
“Tom Silva foi o professor de meu primeiro curso intensivo de cutelaria. Durante o curso, nos tornamos amigos e comecei a trabalhar em sua oficina, junto com Maurício Pinto e Luciano Silveira, que também são grandes amigos e cuteleiros formidáveis”, ressalta.
Após o curso, participou do Campeonato de Forjamento na AGC em que foi entrevistado pela TVE numa matéria sobre cutelaria. "Com 14 anos, na segunda feira anual de cutelaria, recebi o prêmio de Melhor Cuteleiro Iniciante. Logo após, fui a Nova Petrópolis, a convite do Daniel Jobim, para fazer meu segundo curso de cutelaria, dessa vez, de faca integral, fiquei uma semana em sua casa estudando e aprendendo muito”.
Erechim e tatuagem
“Com meus 16 anos, minha mãe vendeu a oficina e fui morar com meu pai. De volta à Erechim, fiquei dois anos quase sem contato com a cutelaria. Aproveitei para estudar design, desenho, pintura e outras artes na Escola de Belas Artes de nossa cidade. Estudei tatuagem com o professor Eddy Martinelli na escola Legion Tattoo”, comenta.
Com a pandemia, retornou a Porto Alegre, e parou novamente de trabalhar com a cutelaria, por não ter um local próprio. “Vendi meu cabelo para adquirir a máquina e os meus primeiros materiais para tatuar. Logo que comecei a tatuar, me dediquei a me especializar em Lettering e Black Work, tive a oportunidade de fazer um curso de custom lettering com o Baganos Revolts”, disse.
Durante os últimos anos, Gabriel afirma que evoluiu muito e vem criando seu próprio estilo e público de tatoo. “No meu último contato com a oficina, fiquei dois meses trabalhando em Caxias, na oficina do amigo Sérgio Souza, que também me acolheu em sua casa junto de sua família e me permitiu grande aprendizado.
Cutelaria e tatuagem
“Tenho conciliado a cutelaria e tatuagem, duas artes que pedem dedicação constantes. Formas geométricas, linhas, curvas, simetrias de design que são essenciais na cutelaria e na tatuagem. Criar peças harmônicas, conceituais e originais é um desafio constante, a cada novo projeto. Enquanto não tenho um lugar próprio para trabalhar, venho montando, aos poucos, minha oficina no quarto”, relata.
E, acrescenta, “sou imensamente grato, a todos que de alguma forma estiveram e estão presentes nessa história, a todos que me ajudaram e seguem ajudando. Sigo no mundo do trabalho manual, trazendo um pouco de arte, cultura e história”.